Instituído a pedido do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso do Sul (TCE-MS) para fazer um “pente-fino” no funcionamento do transporte coletivo de Campo Grande, o setor de auditoria da Agência Municipal de Transporte e Trânsito (Agetran) nunca fez uma revisão técnico-operacional em três anos.
Revelação sobre a demora de abertura da primeira auditoria técnico-operacional do setor ocorreu durante o quarto dia de oitivas da Comissão Parlamentar de Inquérito (I) que investiga o transporte coletivo da Capital na Câmara Municipal.
Conforme Henrique de Matos Moraes, de 40 anos, que foi auditor-chefe do setor na Agetran e no mês ado foi promovido a diretor de Transporte, a unidade foi criada apenas em 2022, 10 anos depois do início do contrato de concessão da Prefeitura de Campo Grande com o Consórcio Guaicurus.
Ou seja, o ex-chefe do setor de auditoria chegou a ganhar até uma promoção sem sequer publicar uma auditoria sobre as contas da concessionária.
Questionado em I pela vereadora Luiza Ribeiro (PT) sobre quando foi a primeira vez que o setor elaborou uma auditoria técnico-operacional para fiscalizar o transporte coletivo, Henrique Moraes disse que em dezembro do ano ado e que a auditoria está em andamento neste ano, para averiguar informações de um índice do Relatório de Monitoramento dos Índices de Desempenho (Remid).
“Neste tempo de criação da unidade de auditoria, apenas três monitoramentos de índices [Remid] e uma auditoria foi aberta, auditoria esta que ainda não concluída”, descreveu a vereadora.
Justificando a demora para a efetuação do trabalho, desde a criação do setor, em abril de 2022, até o mês em que foi iniciada a primeira auditoria, em dezembro de 2024, Moraes disse na I que isso ocorreu em função de um trâmite burocrático.
“Para que a gente pudesse começar a primeira auditoria, precisávamos de uma aprovação do plano de auditoria, que ou por uma formatação com o Tribunal de Contas e entrou em vigor por meio de uma portaria em abril de 2024”, declarou Henrique Moraes.
Luiza Ribeiro também questionou quanto ganha um auditor da Agetran, e, em resposta, o ex-auditor-chefe informou que a remuneração mensal fica em torno de R$ 21 mil e que os auditores-chefes, sua antiga função, recebem R$ 31 mil.
De acordo com o servidor, por volta de 60 auditores trabalham na agência, porém, ele não soube responder exatamente quantos trabalham exclusivamente para fiscalizar o cumprimento do contrato e as obrigações estabelecidas no termo de ajustamento de gestão (TAG).
Conforme informa a portaria que regulamentou os procedimentos para efetivação do plano de auditorias técnico-operacionais, a lotação para a unidade istrativa de auditoria é de, no mínimo, quatro servidores.
INFRAÇÕES E MULTAS
Do início deste ano até abril, o Consórcio Guaicurus acumulou 1.726 autos de infrações com o município de Campo Grande – os de maior ocorrência incluem atrasos e ônibus que nunca chegaram.
Os dados foram apresentados por Henrique de Matos Moraes em depoimento da I. Segundo o ex-auditor, são 593 autos de infração por descumprimento do horário de viagem acima da tolerância estabelecida na ordem de serviço em qualquer ponto de verificação, que são os atrasos em grande tempo, queixa relatada diariamente pela população.
Também relatou 178 autos por omissão de chegada, ou seja, quando o ônibus não chega ao destino ou não a pelo ponto, e 164 autos de infração por omissão de saída, quando o ônibus não sai do terminal.
“Quando o ônibus não a no local, quando não tem ônibus, ele teria de chegar no terminal mas não chega, ele teria de sair do terminal mas não sai, quando o ônibus não aparece no ponto de verificação. Não é questão de atraso, quando ele atrasa é uma tipificação. Quando ele não a, o carro tem omissão”, explicou Moraes na oitiva.
O servidor também relatou que a concessionária teve 144 autos por omissão de viagem, quando a viagem não ocorreu mesmo estando programada em tabela, e 110 autos por falta de veículo reserva em número estabelecido pela Agetran.
Para essas infrações se efetivarem em multas, é necessário que o setor de processamento, chamado de Junta de Análise e Julgamento dos Recursos de Transporte (Jajur), analise esses autos. Henrique de Matos Moraes não soube dizer quantas destas infrações mencionadas viraram multas para o consórcio.
PESQUISA DA OUVIDORIA
No início da oitiva, o vereador Dr. Livio (União Brasil) apresentou uma denúncia anônima vinda de um servidor da Agência Municipal de Regulação dos Serviços Públicos (Agereg).
Segundo a denúncia, as pesquisas feitas na Ouvidoria da agência são falsas e manipuladas para que haja mais avaliações positivas do que negativas sobre o funcionamento do transporte público.
“As recentes pesquisas divulgadas, que tratam da qualidade e da satisfação com o transporte coletivo na cidade de Campo Grande, contêm dados falsificados. Os números apresentados nos relatórios foram deliberadamente inflados, com o objetivo de criar uma imagem positiva do serviço prestado, que está muito aquém da realidade vivenciada diariamente pela população”, disse o denunciante em e-mail.
O denunciante complementou dizendo que “os resultados foram manipulados para apresentar um número significativamente maior de respostas positivas, quando, na verdade, os dados brutos indicaram altos índices de insatisfação e críticas recorrentes”.
Saiba
Até o momento, foram feitas 485 denúncias à I, sendo 415 por WhatsApp, 32 por formulário, 35 por e-mail, 2 por ligação telefônica e 1 de forma presencial.